Queria Poder Voar Pra Te Encontrar

Queria, de verdade, poder voar. Não pelas alturas, nem pela paisagem vista do céu. Queria voar porque caminhar até você já não é mais possível — não há estrada, ponte ou estação que me leve. O que nos separa não é o espaço, é o tempo. E contra ele, não há trem que chegue, nem asa que aguente.

Queria poder voar, não como os pássaros, mas como os sonhos que atravessam noites insones e se alojam no peito da gente. Voar por dentro do silêncio, do que não foi dito, do que restou suspenso entre a última mensagem e o último olhar. Porque há ausências que doem menos quando a gente fecha os olhos e inventa asas.

Às vezes, no meio da tarde, paro tudo. Só pra te imaginar ali, encostado na varanda, distraído, como se ainda fosse ontem. E então penso: se eu pudesse, voaria. Rasgaria a tarde, romperia o vento, só pra sentar ao teu lado por cinco minutos. Só pra dizer que ainda me lembro do teu riso torto e do jeito como chamava meu nome quando fingia estar bravo.

Voar pra te encontrar seria, talvez, o único milagre que eu aceitaria sem questionar. Não pra consertar o que passou — eu sei, passou —, mas pra pousar na borda do teu mundo e dizer: ainda guardo um lugar pra você aqui, mesmo que a vida tenha seguido, mesmo que a distância já não seja só geográfica. É indecifrável e misteriosa.

E então, quem sabe, ao te ver de novo, eu pudesse enfim pousar. Mesmo que fosse só por um instante. Mesmo que depois eu precisasse voltar pro chão.

Mas por agora, só resta isso: a vontade. Essa vontade funda de voar pra te encontrar. Porém, o céu insiste em permanecer longe.

Silvia Marchiori Buss

 

 

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