As Gavetas da Mente e Suas Chaves Específicas (Crônica)

Nossa mente é um vasto móvel de gavetas, cada uma guardando memórias, ideias, valores e sentimentos. Cada gaveta tem sua chave, única e intransferível, como as portas que abrem e fecham os capítulos da nossa vida. Às vezes, perdemos essas chaves. Outras vezes, confundimos as gavetas. E é nesse desencontro que o caos se instala.

Quando as gavetas da mente estão desordenadas, somos lançados num turbilhão. Sentimentos que não deveriam se misturam, ideias perdem seu contorno, e antigos valores parecem se dissolver diante do novo. É um momento de profundo desassossego, em que o conhecido dá lugar ao incerto e o chão firme cede espaço ao vazio.

Mas há beleza no caos, mesmo quando ele dói. É nele que nossa mente busca reorganizar-se, criando novos caminhos e ajustando o que ficou para trás. Esse processo não é rápido, nem confortável. É como abrir uma gaveta emperrada: exige força, paciência e, às vezes, aceitar que algo dentro pode se partir antes de encontrarmos o que buscamos.

A dor, especialmente, é uma dessas gavetas de chave difícil. Guardamos nela nossas maiores perdas, nossos amores que partiram, os sonhos que ficaram pelo caminho. Quando essa gaveta insiste em se abrir sem aviso, somos obrigados a encarar o que está dentro. No entanto, ao enfrentarmos esse momento, temos a chance de nos recriar.

Porque, ao fim do caos, algo novo nasce. Quando as gavetas encontram suas chaves, quando reorganizamos a desordem, descobrimos que saímos mais fortes, mais leves. Carregamos ainda o peso do que foi, mas transformado. E essa transformação nos humaniza, nos aproxima uns dos outros, porque todos, em algum momento, já enfrentaram o caos de suas gavetas internas.

Que nunca percamos a esperança de sair melhores desses momentos. Que a desordem que nos consome seja também o solo fértil para novos valores, para uma compaixão mais profunda, para um entendimento maior de nós mesmos e do outro. Afinal, as gavetas da mente são como a vida: só revelam todo o seu potencial quando nos permitimos abri-las, enfrentá-las e, por fim, reorganizá-las.

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Silvia Marchiori Buss

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