No tempo certo

Eram duas almas tão próximas e, ao mesmo tempo, distantes como as estrelas em lados opostos do céu. Marta e Eduardo viviam em cidades vizinhas, suas vidas entrelaçadas por coincidências quase poéticas: frequentavam os mesmos lugares, amavam os mesmos livros e até compartilhavam os mesmos amigos. Mas, como o destino às vezes prega peças, nunca se cruzaram. Era como se uma força invisível os mantivesse em órbitas separadas, atraindo-os e repelindo-os ao mesmo tempo. Marta, com o coração sonhador, partiu para uma jornada de autoconhecimento, percorrendo estradas que a levaram a amores passageiros e fugazes, a paisagens marcantes, mas não a uma vida enraizada. Eduardo, com a sensibilidade de quem ouve o silêncio das folhas caindo, seguia sua vida numa busca calma e serena por algo que ele nunca soube nomear. Os anos passaram, e as histórias que viveram os moldaram como pedras lapidadas por grandes ondas de memórias e arrependimentos. Marta, agora com os cabelos salpicados de prata, voltou à sua cidade natal para um evento literário. Eduardo, um dos convidados de última hora, também estava lá. No pequeno e charmoso café onde acontecia o evento, seus olhares finalmente se cruzaram. Algo pulsou no ar, uma sensação inexplicável de reconhecimento. Seria tarde demais? Iniciaram uma conversa que se tornou longa e quase mágica. As palavras fluíam como se fossem as mesmas, quase diziam as mesmas coisas ao mesmo tempo... Era como um quebra-cabeça que começava a encontrar suas peças fora do lugar. As lembranças de caminhos que cruzaram, mas não juntos, os aproximavam agora, quase numa última hora. Sentaram-se muito próximos, no mesmo sofá que parecia tê-los aguardado há décadas; com as mãos entrelaçadas, riram da ironia do destino. Vivenciaram as mesmas coisas, só que separados por uma fina e invisível parede. Não havia mais espaço para culpas ou para os “e se”, apenas o conforto de saber que, em alguma vida, talvez tivessem dançado a mesma música, assobiado ao vento a mesma canção. Mas ali, naquela mesma tarde, eram felizes apenas por, enfim, terem se encontrado.

Silvia Marchiori Buss

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