Amor Compartilhado

Não era um amor de cinema. Não havia promessas sob a chuva, juras sussurradas ao pôr do sol ou dramaticidades à flor da pele. Mas havia café passado na hora certa, coberta dividida nas madrugadas frias e um silêncio confortável entre dois corpos que já não precisavam se provar nada.

O amor compartilhado não vinha com fogos, mas com pequenos acenos diários. Ele estava no olhar cúmplice diante de uma piada interna, na toalha deixada estendida para o outro usar, no saber o que o outro gosta no pão — com manteiga, sem geleia, morno. Era quase invisível aos olhos alheios, mas, para quem vivia ali, era vasto como oceano em dia calmo.

Esse tipo de amor não tenta salvar ninguém. Não se impõe como remédio, nem se disfarça de destino. Ele se oferece, apenas. Com sua leveza que não é desimportância, com sua constância que não é tédio. É presença que escolhe ficar, mesmo quando tudo à volta convida a partir.

Amor compartilhado é o que acontece quando duas solidões se reconhecem e, em vez de se anularem, resolvem caminhar juntas. Não para curar as feridas uma da outra, mas para aprender a tocá-las com cuidado.

Não precisa dizer “eu te amo” todos os dias, porque o amor já está dito no modo como se fecha a porta devagar quando o outro está dormindo. No modo como se pergunta: “Chegou bem?” com a voz de quem realmente quer ouvir a resposta.

Talvez não tenha história com final épico. Mas teve começo, meio e — enquanto foi possível — continuidade. Um amor desses não exige aplausos. Basta que seja vivido.

E foi.

Silvia Marchiori Buss

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